Seria injusto falar da história do cinema sem atravessar os proscénios do palco do teatro. Ainda que, inicialmente, o cinema tenha se posicionado autenticamente a partir do momento em que assumiu seu lugar diante do seu distanciamento com o teatro – também por uma certa ideia de pureza, já anacrônica –, hoje, em um mundo idealmente conectado e de distâncias encurtadas pelo on-line, essas linguagens assumem a impossibilidade de uma arte pura e, portanto, a potência de caminharem juntas em um tipo de mutualismo criativo.
Se para o crítico André Bazin o cinema é a linguagem da identificação e o teatro, da oposição¹, não seria o audiovisual realizado a partir da assimilação de dispositivos teatrais um exercício exímio de outridade? Não só pela ideia inerente de encontro, mas também pela compreensão de que o cinema é, pois, um gesto. Um gesto estético que pode ser considerado teatral, uma vez que significa ver uma vez mais, ver de uma outra maneira – quase ingenuamente, pela primeira vez –, isto é, desacostumar-se com as imagens criadas.
O espectador não-passivo, no cinema, incorpora Sísifo, carregando montanha acima a experiência do filme, sabendo exatamente como ela pode vir a acabar. Por isso, também, é um gesto de crença. Decidir acreditar no caminho que apresenta o filme (ou a obra teatral) é abrir-se para o estranhamento, para o deslocamento, força motriz da mudança no mundo. A mostra de curtas-metragens busca filmes que propõem mundos de credulidade complexas, inventando espaços e tempos de existência possíveis, ainda que aparentemente impossíveis.
Subamos as cortinas ².